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A bicharada falando de deficiência

Campanha da Fraternidade 2006

Autoras: Patrícia Geciauskas e Cecília Pellegrini

Na floresta moram duas amigas, a tigresa Nina e a ursa Manu. Elas dividiam uma toca, porém há tempos deixavam tudo muito bagunçado.

Certo dia elas estavam dormindo quando a campainha tocou. A Nina, deu um rugido, virou-se para o lado e, com a insistência da campainha ela gritou: - Já vai, já vai... ai que sono.

Ela deu um rugido-bocejo e voltou a dormir.

Malu levantou a cabeça do travesseiro, também deu um rugido-bocejo e reclamou: - Se toca Nina, tem bicho na nossa toca...

E voltou a dormir...

A Nina levantou-se imitando a amiga: - Se toca, tem bicho na toca... que coisa, esses bichos pensam que sou surda...

Ela abriu a porta e deu de cara com um elefante. Era o Tito.

Ele falou: - Nina? É você? Ouvi você gritando como sempre com a campainha...

Ela o reconheceu: - Tito? Não acredito, você sumiu, peraí... está bem diferente... o que aconteceu com você? Parece meio “quebradão”, ai que saudades!

- Eu também estava com muitas saudades... Ele respondeu enquanto estavam se abraçando.

Com toda simpatia ela convidou: - Venha, entra...

E o foi puxando, sem saber onde pegar, mas Tito interrompeu: - Calma Nina, preciso ir devagar. Não me lembro direito de como era sua toca...

Admirada Nina fez várias perguntas: Hãããã, como assim? O que aconteceu com você depois de todos esses anos? Esses óculos, essa sei lá... bengala?

Ele explicou: - Nina, Nina, aconteceu algo muito triste comigo depois de sofrer um acidente horrível na floresta perto do riacho.

Nina ficou perplexa: - Não me diga! Ali no riacho, onde sempre colocam armadilhas para pegar os bichos da floresta?

- Exatamente. O buraco era tão profundo, acabei perdendo a visão do olho direito, perdi a pata dianteira esquerda e a pata traseira esquerda ficou semiparalisada, motivo pelo qual ando de bengala.

Ele falou tranquilamente como se já tivesse superado o “trauma”.

A tigresa não se conformou: - O quê? Você? Ficou assim? E fala com essa calma toda... Eu, eu nem sei o que dizer...

Ela andava de um lado para o outro e não parava de falar: - Como foi que isso aconteceu? Que vida é essa que a gente leva, só problemas, só problemas... E esses humanos que só querem pegar os animais e vender, feito objetos.

- Calma Nina, calma... eu já estou superando isso, demorou um pouco, é verdade, mas hoje sou um “outro” animal, hoje dou muito mais valor à nossa vida aqui na floresta... às verdadeiras amizades, à minha família, enfim, vamos falar de coisas boas? ... E você? o que você tem feito?

Ela respondeu agitada: - Ahhh, sei lá, trabalhando... sabe como é que é né? Mas olha, eu estou tão preocupada com você, você nem me avisou... E agora? O que você vai fazer? Como vai... sei lá...

O elefante tentou acalmá-la: - Ninaaa, esquece isso, já passou, hoje estou bem... quero saber sobre você... Ahhhh, lembra aquele curso de pintura que começou? Já terminou?

E ela começou a reclamar novamente: - Ahhh Tito, sabe o que que é ... ai, a vida é tão dura, você sabe... acabei desistindo... muito cansativo, muito mesmo, tinha que seguir pela trilha dos arbustos pra ir. Aquelas plantas ressecadas, cheias de espinho, me arranhando toda. Ir e voltar por esse caminho. Depois andar mais um pedaço, não é fácil não, longe, muito longe...

- Puxa vida... que pena, você gostava tanto... Comentou o amigo.

A tigresa continuou: - Pois é, mas são as dificuldades da vida aqui na floresta... a gente tem que abrir mão, quero dizer, abrir a pata de tanta coisa... Tito, estou tão preocupada com você, ai que vontade de chorar.

- Ei... pára com isso Nina, já disse, estou bem... hummm... me lembrei... e o seu piano? Onde está? Lembra que começou aprender a tocar?

- Meu piano? Ahhhh é... já ia esquecendo, lembraaaa? Pois é, vendi...

Ele não acreditou: - Vendeu?

A amiga mais uma vez tinha mil justificativas: - Então... eu até comecei a participar das aulas sabe, mas como eram à noite, aquela música toda ia me relaxando, e eu acabava dormindo na sala de aula, acredita? Vendi meu piano, mas troquei por um cachorro com pedigree e tudo... Você sabe, né, agora os poucos bichos que restam na floresta resolveram imitar os humanos: ter um animalzinho de estimação. Não pensei 2 vezes: troquei o piano pelo cachorro, com pedigree e tudo. Mas, você não sabe, o danado, mal-agradecido fugiu. Você acredita? Tinha tudo aqui na toca e acabou fugindo, é como eu sempre falo, os bichos não dão valor a nada do que tem, nem os cachorros... por isso que eu sempre falo: como nós, os animais temos problemas não é verdade?

- Mas estou preocupadíssima com você, hãããã quer um leite, água, sei lá... qualquer coisa...

Ele escolheu: - Água Nina, por favor...

Nina pegou um recipiente com água e foi tentar ajudá-lo a tomar: - Tome, eu ajudo você...

- Não, não precisa Nina... Eu posso fazer isso e muitas outras coisas sozinho... Obrigado.

Malu apareceu: - E aí? Fala aí bicharada!

Nina a apresentou: - Essa é minha amiga, Maria de Lourdes... Lembra dela Tito? Aquela que só quer imitar os humanos. Olha só como ela...

A Malu interrompeu a fala da Nina: - Pô pára, pô pára... Maria de Lourdes não, meu nome é MALU entendeu? Igual àquela atriz famosa. Pô... sai fora, que coisa, tenho que ficar repetindo toda hora, toda hora...

- Como você está Malu? Eu me lembro de você sim. Vocês resolveram dividir as despesas da toca aqui na floresta porque acabou a mata do outro lado da montanha, não é?

Nina respondeu admirada: - Nossa, que memória de elefante... Foi isso mesmo.

Malu fez um comentário maldoso: - Nossa! “cê” tá velho, heim? Peraí, você é meio cegueta?

Nina a repreendeu: - Maria de Lourdes!

Tito falou gentilmente: - Deixa Nina, eu lido diariamente com esse tipo de reação. Sim Malu, sofri um acidente e acabei ficando com apenas metade da visão...

O que você vai fazer?

Ele explicou: - Já faço... eu trabalho, estudo, cuido da minha toca, das minhas coisas, até do meu cachorro, e olha que ele nunca fugiu de casa...

- Meu, que irado... Ele até tem cachorro também... Exclamou Malu admiradíssima.

O elefante quis saber: - E você? Está estudando? Quantos anos você tem hoje?

Malu respondeu: - Então... tenho 22, parei de estudar porque era muito complicado, sabe como que é? Ai, eu acho um “porre” a escola sabe? Agora vou tentar, sei lá, acho que vou tentar arrumar um emprego, tô pensando ainda o que eu gosto de fazer..., mas “meu”, é como a Nina fala, até que isso eu concordo, é tudo supercomplicado sabe...

- Que pena que você pensa assim Malu, você é tão nova... Tito refletiu.

Nina ficou curiosa: - Peraí Tito... Como é que você estuda? Trabalha? Não acredito... Como faz isso sendo assim?

O elefante contou: - Ah Nina, acabei me adaptando, mudei alguns hábitos, aprendi a mexer com apenas um lado do corpo, até aprendi “braile”, e muitas outras coisas...

- Braile? Aqueles pontinhos? Nossa! Ai, Tito, tô tão preocupada com você... A Nina não se cansava de demonstrar preocupação.

Tito perguntou: Mas você ainda não me contou o que tem feito... tem trabalhado? Tem ido à missa? Lembra quando você participava do teatro na missa dos filhotes? Como era lindo ver aquele monte de bichinhos, tão pequeninos olhando, rindo, participando, aprendendo...

Ela começou a relembrar: - Nossa! É verdade... eu tinha até esquecido... bom, tô trabalhando numa firma de quebrar coco pra macaco. Ah, essa firma é muito chata, período integral, acredita? Das 8 da manhã até às 5 da tarde, faz uma ideia de como eu tô cansada? Bom e na missa, ai faz tempo que eu não vou viu, não consegui arrumar tempo ainda... Quando acordo pronto, a missa já começou e à noite me dá uma preguiça... é complicado...

Malu concordou: - É... complicado... Parei de ir também pelo mesmo motivo.

Agora foi a vez do Tito se preocupar: - Que pena Nina, que pena Malu, estou tão preocupado com vocês...

As duas perguntaram: - Hãããããa? Preocupado conosco?

O amigo relembrou: - Nina , quando eu te conheci, você era um animal tão positivo, trabalhava, estudava, fazia tantas coisas, cuidava tão bem da sua toca, escrevia historinhas de teatro para os filhotes na Igreja... já eu não, eu era um animal que vivia achando que a vida era difícil, que tudo era muito complicado, eu reclamava de tudo, mas agora não... hoje eu sei que tinha tudo, mas eu não enxergava, hoje sim eu enxergo tudo o que Deus, o bicho-rei, me deu e de tudo o que sou capaz de fazer... Mas sabe por que estou aqui?

- Não... O que foi agora? Nina falou.

- Ué... veio visitar a gente... Malu revelou.

Mas Tito explicou: - Também, mas preciso da ajuda de você...

Nina perguntou: - Ué... nossa ajuda? Como assim?

E Malu cochichou no ouvido da amiga: - Sabia que ia sobrar pra mim...

O elefante explanou: - Vocês pararam de ir à missa, mas eu continuei firme e forte. Por isso consegui superar as consequências do acidente tão bem. Este ano, estamos falando dos bichos que, assim como eu, possuem algum tipo de deficiência.

As duas falaram ao mesmo tempo: - Ah! Então tá fácil pra você!

Ele respondeu: - Sim, mas preciso da criatividade de vocês para conseguirmos fazer com que os bichos filhotes, os pequeninos ainda, consigam entender a mensagem que queremos passar.

As amigas não estavam acreditando: - O quê? Você... quer a nossa ajuda?

- Vamos lá, amigas, vocês podem, basta querer.

Nina falou enquanto recolhia as roupas espalhadas pela toca: - Nossa, que honra Tito. Voltar a organizar as ideias, as palavras, criar historinhas...

- Taí. Adorei! Conte conosco Malu também aceitou e as duas abraçaram o Tito.

Muito feliz ele agradeceu: - Obrigado, eu sabia que vocês topariam.

Nina reconheceu: - Está na hora mesmo de movimentarmos um pouco mais a nossa vida, não é Malu?

- É sim Nina. Eu precisava de um agito, de um objetivo. Pensar nesses filhotes, irá me fazer um bem danado.

Elas abraçaram o Tito novamente: - Obrigada Tito!

O amigo fez um convite: - Que tal irmos lá rever a comunidade? Eles vão adorar.

Elas toparam na hora:- Vamos agora mesmo.

Os três amigos saíram felizes e tudo mudou na vida deles e da comunidade. Tchau filhotinhos ...

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